sexta-feira, 13 de março de 2009

O ROSTO DO DIABO




Crentes ou não, as figuras da Bruxa e do Diabo nos inquieta, nos perturba e nos causa angústia. Todavia, sabemos a razão disso? Quem é o
Diabo?
O Diabo, tal como entendemos normalmente, não é exatamente o que pensamos. Mais uma vez, as raízes etimológicas nos informam sobre o sentido exato do termo e nos revelam que a interpretação que lhes damos e as representações que dele fizemos são falsas. O termo grego "diabolos", de onde vem o nosso diabo, significa literalmente "o que tira de um lado e de outro, que desune, separa, semeia a discórdia". É a palavra que os tradutores gregos da Bíblia empregaram para traduzir do hebraico o termo "satân", o acusador e que ainda hoje se utiliza como satã ou satanás.
De fato, um dos papéis do Mal, na tradição judaica, é o de acusar os justos diante do Tribunal de Deus. Para os gregos, um "diabolos" era um acusador, um caluniador, um personagem não muito bem visto.
No século X, o latim tardio "diabolos" já tinha derivado em "diabo" no idioma castelhano com o sentido de demônio. No século XIII já estava enraizada uma "ciência" de caráter diabólico para preparação de poções, beberagens mágicas e remédios. Era um dos muitos ramos da magia. A partir daí, podemos dizer que passamos da noção antiga de acusador público, função exercida hoje em dia por um fiscal em um tribunal de justiça, à noção medieval, mais moderna, de demônio. Mas foi a idéia de demônio que ficou gravada na memória e à qual nos referimos hoje em dia, sem saber muito bem o que quer dizer "demônio", exceto que, para nós, é uma representação ou encarnação do Mal.
Mas o demônio em si mesmo nada tem de mal, negativo ou maléfico, pelo menos se consideramos o seu sentido original. De fato, até os princípios do século XIV, "daemon" ou demônio não tinha sido identificado com este espírito infernal, de anjo mau, anjo caído ou diabo. Antes disso, o daimôn grego era um poder divino e benéfico, que distribuía e repartia. Reencontramos aqui o sentido "tirar de um e de outro" evocado anteriormente. O daimôn era a divindade ou espírito protetor ligado a cada homem ou a cada elemento da natureza. Ele tinha os mesmos atributos e funções que os famosos espíritos da natureza, nos quais Dionísio se inspirou para criar a hierarquia celeste dos anjos.
Mas como pode um elemento tão benéfico para o ser humano tenha podido tomar uma acepção tão negativa, sinistra, convertendo-se na única acepção do diabo? Daí deriva o termo grego "demos", o povo ou população. Também encontramos esta raiz em "demagogia" e "democracia", bem como em "epidemia" e "demiurgo". A história nos ensina que aqueles que detinham o poder, nem sempre agiam em favor do povo, pois eram homens e podiam trair sua própria natureza original e exercer algumas vezes uma influência maléfica. É assim que, pouco a pouco, o demônio foi tomando a aparência das forças essencialmente maléficas e destrutivas, pois os dramas, perseguições, guerras e violência gerados por seres de forte personalidade, com uma excessiva sede de poder e ânsia de divisão, com ambição desmedida, estão gravados na memória coletiva. E atualmente não acontece ainda o mesmo? Sim, mas estamos longe do imaginário medieval dos conciliábulos de bruxas ou missas negras, durante as quais se prestava culto ao Diabo, encarnação do espírito do Mal, por oposição a Deus, espírito do Bem. Devemos ter em mente, que a idéia que temos destas práticas estão totalmente sobrevalorizada: a maioria eram ritos pagãos baseados em crenças anteriores ao cristianismo e grande parte deles se baseava nos poderes que se atribuíam aos deuses, às divindades, e aos espíritos protetores presentes na natureza.
Aqui, mais uma vez, o caráter diabólico, no sentido pejorativo do termo, que se dava a estas crenças e ritos, desviou estas práticas do seu significado original e profundo. Em si mesmas não tinham nada de maléficas, mas por sua própria vontade pagã e popular perturbavam a ordem estabelecida daquelas épocas de desconcerto. Foi assim que os demagogos, "os que dirigiam o povo", inventaram o Diabo e os demônios e, deste então, o Diabo e os demônios têm muita má reputação e são representados com imagens que nada têm a ver com o que já foram.
O DIABO NO FOLCLORE GAÚCHO
O povo gaúcho acredita no Diabo e ele aparece como uma antítese de Deus. Tão temido ele é, que seu nome não é pronunciado muitas vezes, então usa-se no Rio Grande outros apelidos para mencioná-lo: Capeta, Vermelhinho, Demo, Belzebu, Satã, Diabrete, entre outros.


CONTO: A ESTRADA DO DIABO
Você deve estar se perguntando, o diabo já tem estrada? Pois saiba que no Rio Grande do Sul ele não tem só estrada, tem o Rincão do Inferno, entre Lavras e Dom Pedrito e uma Estrada do Inferno, entre Palmares e Mostarda. Na estrada que vai de Santa Maria a Cruz Alta há a Garganta do Diabo e o trecho da Estrada da Produção do Arroio Tijela até a entrada de Soledade é a Estrada do Diabo, onde sempre ocorrem acidentes com morte. Como podemos ver, o Diabo no sul do país, tem moradia, estrada e garganta..., por isso é que gaúcho treme de medo dele! Contam o povo de Soledade, que em uma noite muito fria, que assobiava um minuano, tal qual alma penada, trafegava um ônibus quase vazio subindo a serra. Nos bancos da frente dois homens discutiam as mortes na Estrada da Produção, naquele trecho. Um deles assegurou que agora os acidentes iam diminuir porque a Polícia Federal ia estabelecer um posto logo à saída da cidade, no que vai para Passo Fundo.
No banco de trás, um moço moreno, crespo, com os dentes muito brancos, sorria muito, ouvindo a conversa.
Quando o ônibus parou em um restaurante,à entrada da cidade, os homens desceram e o rapaz moreno e crespo passou por eles e disse:
- " Não adianta botarem Polícia Rodoviária aí. Essa estrada é minha, daqui até o arroio da Tijela. E vai continuar morrendo gente cada vez mais!" E riu.
Os homens perguntaram:
- "Mas quem é o senhor, afinal?" Ele não respondeu. Só riu mais ainda e foi recuando para dentro do nevoeiro, deixando no ar um cheiro de enxofre. É por isso que o povo sabe que aquele trecho da Estrada da Produção é a Estrada do Diabo.
Canção Folclórica do Diabo (Este gaúcho é macho tchê!) "Eu entrei no inferno a bala, com fama de valentão, tirei o Diabo no tapa e a Diaba no bofetão e ainda fiz os diabinhos tudo me pedir benção". Ou ainda os alegres versos: "Que os homens são todos diabos não há mulher que ainda negue mas todas elas procuram por um Diabo que as carregue...."
OS ROSTOS DO DIABO Dizem que o diabo se mostra sob aparências variadas de animais: grande carneiro provido de chifres, bode malcheiroso e lúbrico, cão preto. Segundo uma crença de Creuse, ele se metamorfoseia às vezes em um grande gato preto e põe-se ao pé do leito, para espreitar a alma do pecador moribundo ao sair do corpo. Outra crença, já nos afirma, que a cabeça do gato pertence ao Diabo, ao passo que o resto do corpo é de Deus. A serpente também representava o diabo, assim como o morcego. Este último, que na magia simboliza o crepúsculo, o mistério e o androginismo, era acusado de participar do sabth. No Meio-Dia, era chamado "Mosca do Inferno", e os camponeses pregavam-no à porta dos celeiros para impedi-lo de praticar malefícios. A outra forma usada pelo Diabo é a do lobo, que, segundo São Mateus, simboliza os falsos profetas. " O Diabo, escreve ainda de Lancre, prefere transformar-se em lobo, porque o lobo é devorador e, por isso, realiza mais mal do que qualquer animal. Também por que é inimigo mortal do cordeiro, cuja forma foi representado Jesus Cristo nosso Salvador e Redentor."
DEMÔNIOS EM FORMAS ANIMAIS: ABRAXÁS: Demônio coroado, com cabeça de galo, vente proeminente e cauda amarrada, portando chicote e escudo. ADRAMELEC: Grande chanceler dos Infernos, presidente do Alto Conselho dos demônios, intendente do guarda-roupa de Belzebu. Mostra-se na forma de mulo, com dorso humano e cauda de pavão. AGORE: Grão-duque da região oriental dos Infernos, mostra-se sob o aspecto de um senhor de cavalo em um crocodilo, com um gavião no punho. ASMODEU: Demônio destruidor, superintendente das casas de jogos infernais. Possui três cabeças: uma de touro, outra de homem de hálito inflamado e uma de carneiro. Mostra-se a cavalo em um dragão, tem cauda de serpente e pés com a forma de patas de ganso. AIPEROS: Príncipe infernal que comanda trinta e seis legiões. Mostra-se na forma de abutre ereto. BELZEBU: Príncipe dos demônios, segundo as Escrituras, chefe supremo do império infernal. Seu nome significa "Senhor das Moscas". Mostra-se, às vezes, sob o aspecto de uma grande mosca, de serpente ou em forma humana com grandes asas de morcego, pés de pato e cauda de leão. CAIM: Grande presidente dos Infernos, aparece sob os traços de homem, com cabeça e asas de melro. DAGON: Padeiro infernal, grande dispenseiro da casa dos príncipes infernais. Originariamente, era deus adorado pelos filisteus, na forma de homem com cauda de peixe. HABORIM: Duque infernal, comanda vinte e seis legiões. Cavalga uma víbora e tem três cabeças: uma de gato, uma de homem e uma de serpente. NABERUS: Marquês do mundo infernal, é o Necromante Maldito. Aparece na forma de corvo. ORIAS: Grande marquês do império infernal, demônio dos astrólogos e dos adivinhos. Mostra-se sob o aspecto de leão furioso, sentado em um cavalo com cauda de serpente. Traz uma víbora na mão. OROBAS: Grande príncipe dos Infernos, comanda vinte legiões. Mostra-se sob a aparência de um belo cavalo. OZE: Grande presidente dos Infernos, seu reino dura apenas uma hora por dia. Aparece na forma de leopardo ou de homem. SABNAC: Grande marquês infernal, comanda quarenta legiões. Demônio das fortificações, mostra-se sob o aspecto de guerreiro armado, com cabeça de leão, montado em um cavalo horrível. STOLAS: Grande príncipe dos infernos, comanda vinte e seis legiões. Aparece na forma de caburé coroado, com três longas patas. SITRI: Grande príncipe dos Infernos, aparece sob a forma de leopardo com asas de grilo. Comanda setenta legiões. VALAFAR: Duque do império Infernal, comanda trinta e seis legiões. Mostra-se como leão, com cabeça e patas de ganso e cauda de lebre. Cada representação de animal, artística, simbólica ou onírica, faz eco à natureza profunda do nosso ser. Todos nós devemos aceitar e integrar a natureza animal para evoluir.


A MISSA DOS MORTOS




Há ainda quem acredite que os mortos não assistem missa, mas essa lenda nos conta que não só assistem, como também realizam suas próprias missas...
Essa lenda faz arrepiar os cabelos do mais incrédulo e foi contada por João Leite, pessoa muito conhecida em toda cidade de Ouro Preto, um homem simples, miudinho, que sempre montado em seu cavalinho branco, se contentava em viver e receber alguns trocados para guardar e vigiar os pertences da Igreja das Mercê de Cima.
João Leite, portanto, era um homem de confiança, uma pessoa estimada e honesta, zelador de um templo, que dormia na tranquilidade da sacristia, que localizava-se ao lado de um cemitério. Entretanto, esse João do Povo tinha origens um tanto misteriosas. Foi abandonado, logo depois de nascer, à porta da Santa Casa, em uma época que ninguém se recorda e não se sabe também quando passou a funcionar como sacristão das Mercê. As mais velhas pessoas da cidade já o conheciam desde criança, com essa mesma cara, sempre com o mesmo cavalinho branco.
Quando alguém lhe indagava sobre suas origens ou o tempo que servia a Nossa Senhora das Mercê, João só sorria, pois até mesmo ele não sabia a resposta.
Um dia, coitado do João, foi encontrado morto diante do altar, deitado no chão, com as mãos sobre o peito, todo arrumadinho para ir directo para o caixão. A partir desse momento, ele passará a frequentar a missa dos mortos, tal qual ele já assistiu há pelo menos uns trinta anos atrás.
Nessa época, João já morava na sacristia, quando em uma noite muito fria, acordou com uns rumores e batidas de sinos na igreja. Descobriu-se de seus cobertores e alerta passou a prestar mais atenção nos tais ruídos. Seriam ladrões? Daí reflectiu um pouco e chegou a conclusão de que a igreja era muito pobre e nada tinha para roubar. Mas quem estaria ali então? Estava triturando essas dúvidas, quando ouviu em alto e bom som:
-"Deus vos salve!"
Estavam rezando a esta hora da noite? Levantou-se e alcançando o corredor, chegou até a porta que dava para a entrada da igreja, que para sua surpresa estava toda iluminada e cheia de fiéis. No altar um sacerdote todo paramentado celebrava a missa. Olhando para a cabeça do padre, observou que não apresentava cabelos e o couro cabeludo era muito branco. João não lembrava-se de conhecer nenhum religioso calvo no clero de Ouro Preto.
Quando desviou o olhar para os fiéis, verificou que todos trajavam capas com capuz pretas e todos estavam de cabeças baixas.

Quando o padre se voltou para dizer o " Dominus Vobiscum", João pode ver seu rosto, que se tratava de uma caveira. Nesse momento, os fiéis levantaram e também foi possível ver que tratavam-se de esqueletos vestidos. Apavorado com o espectáculo, que mais parecia se tratar de um filme de terror, correu porta à fora, deparando-se com a porta do cemitério que encontrava-se completamente escancarada.
Imaginou-se então, estar tendo um pesadelo e voltou para sua cama, cobriu a cabeça e morto de medo, ficou quietinho ouvindo as almas orando. Se quisessem rezar, que o fizessem, pois a igreja era para o povo, vivo ou morto, mas ele é que não iria nunca mais assistir tão macabra cena. Ah,
isso não...!